A prática dos ensinamentos do Buda é frequentemente apresentada como uma viagem, uma jornada, e os oito passos do caminho óctuplo como a estrada real a trilhar. Um dos grupos de factores que recebe uma proeminência especial nos sutras é a das cinco faculdades espirituais – convicção (ou fé), esforço, atenção plena, concentração e sabedoria. A palavra em sânscrito para faculdades espirituais é indriya, que deriva do deus Indra, soberano dos devas. O termo sugere assim a qualidade divina de controle e domínio. Tal como o deus Indra venceu os demónios e obteve a supremacia dos devas, da mesma forma cada uma destas faculdades é um pré-requisito para subjugar “os nossos demónios” e para romper as barreiras que nos afastam da libertação. Tal como as virtudes no conceito grego, as faculdades são poderes activos que coordenam e canalizam as nossas energias naturais, permitindo-nos alcançar o equilíbrio interno necessário à nossa verdadeira paz e felicidade.
É importante tomarmos consciência de que sem a influência e contenção destes “agentes de controlo interno”, a nossa natureza não se encontra sob o nosso controlo. Deixada por sua própria conta, sem uma estrutura orientadora, a mente é vítima de forças que nascem dentro de si mesma, que no budismo se denominam kilesas ou kleshas (=contaminação). Enquanto vivermos sob o domínio das kleshas, não somos senhores de nós mesmos, ao contrário do que às vezes pensamos. Somos mais frequentemente peões passivos, compelidos pelos nossos desejos cegos a agir de formas que prometem satisfação, mas que no final conduzem a mais escravidão.
A verdadeira felicidade envolve necessariamente alcançar a autonomia interna, a força para resistir aos empurrões dos nossos apetites, e isso é alcançado precisamente através do desenvolvimento das cinco faculdades espirituais.
O ensinamento do Buda não pretende implantar essas inclinações na mente a partir do nada, explora sim qualidades que estão já presentes em todos nós, que de uma forma ou outra surgem na nossa vida diária mesmo que de forma simples:
- A convicção honesta em valores superiores
- Um esforço em direcção ao bem
- A consciência atenta
- A concentração focada
- A compreensão inteligente
Parte assim de qualidades preexistentes, dando-lhes um significado transcendente, que visa a realização do Incondicionado.
As cinco faculdades alcançam a completa maturidade no desenvolvimento do insight através da meditação, o caminho directo para o despertar.
Nesse processo, a faculdade de convicção ou fé (não se trata de uma fé cega, mas sim baseada na compreensão) dá a aspiração e a inspiração. A energia (virya) queima obstáculos e causa a maturação dos factores que nos conduzem ao despertar. A atenção plena (mindfulness) contribui para a clara consciência (antídoto para o descuido e pré-requisito para o entendimento). A concentração mantém o foco de atenção calmo e controlado, firmemente focado na origem e cessação dos eventos corporais e mentais. A sabedoria (a virtude máxima - prajna) remove a sombra da ignorância e ilumina as verdadeiras características dos fenómenos. Os pares convicção e sabedoria e energia e concentração agem e equilibram-se entre si. Acima destes pares, a faculdade de atenção plena é o chefe de orquestra. Protege a mente dos extremos e assegura que os membros de cada par estejam em equilíbrio.
apontamentos para o curso à sombra da árvore de Bodhi