22 julho 2007

A teia


P: Como é que o desejo conduz ao nascimento?

R: Toda vez que há um desejo há outro nascimento. Semeamos carência, querendo fazer alguma coisa, querendo agarrar alguma coisa. Então, o desejo de posse também evoca algo mais. Nascimento aqui significa nascimento de mais confusão, de mais insatisfação, de carência. Por exemplo, se tivermos um grande desejo de dinheiro e conseguirmos ganhá-lo em quantidade, também haveremos de querer comprar alguma coisa com o dinheiro. Uma coisa leva à outra, uma reação em cadeia, de modo que o desejo se converte numa espécie de rede. Queremos alguma coisa, queremos trazer alguma coisa para nós, continuamente.

A experiência de shunyata, vendo precisamente e claramente o que é, de qualquer modo rompe através dessa rede, dessa teia de aranha, porque a teia de aranha é tecida no espaço do desejo, no espaço do carecer. E quando o espaço de shunyata o substitui, por assim dizer, toda a formulação conceptual do desejo é continuamente eliminada, como se tivéssemos chegado a outro planeta com ar diferente ou a algum lugar sem nenhum oxigênio. Nessas condições, shunyata proporciona nova atmosfera, novo ambiente, que não suportará o pegar nem o agarrar. Daí que a vivência de shunyata também impossibilita o plantio da semente do karma, razão pela qual se diz que shunyata é que dá nascimento a todos os budas, a todos os despertos. “Desperto” significa não estar envolvido nas reações em cadeia e nas complicações do processo kármico.

Excerto de Perguntas e Respostas com Chögyam Trungpa, transcrita no livro Além do Materialismo Espiritual (Editora Cultrix), e citado por Para ser Zen
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