22 agosto 2005
E eu deixei esse sonho para trás
E eu deixei esse sonho para trás, fechei a porta e vi-me a fechá-la vezes sem conta, o mesmo olhar para trás, repetido. Poderia ter escolhido outra porta, poderia ter entrado de outra forma, poderia ser outra. Não quis olhar, nunca queria olhar novamente, apenas tinha de abrir outra porta. E depois, disseram, poderia ter sido de outra forma, pode ser sempre de outra forma, poderias ter parado, hesitado, poderias ter tentado escapar. Não sei onde encontrar as palavras, um dia não as encontrei, foi só isso, tinha uma bola de fogo a arder nos pulmões e não conseguia cuspi-la e não consegui engoli-la. E há os muros, em bloco, densos, sabes o que é? Possivelmente sempre estiveram lá, como sei, se pensar nisso sempre estiveram lá, e por isso não tenho espaço, há muito tempo que estou aqui sem me mexer. Talvez se me mexer o dia dói. Devagar. Muito devagar. Será que se te olhar nos olhos te vou reconhecer? Ouvia vozes de há muito tempo. Alguém deve ter dito alguma coisa, há muito tempo. Pensei se o tempo parasse, entrava noutra estrada, noutra transversal, não tinha a chaves a pesar na mão. Ao respirar, um instante de liberdade, um suspiro, depois posso continuar. Mas agora parei. No corredor há várias portas. Pus a mão no bolso e segurei a chaves. Tinha de abrir uma das portas. Talvez só tivesse esta vez.